O impacto das taxas de juros nos passivos atuariais

Por: Sara Marques

25 de março, 2025

Passivos atuariais dos planos de modalidade de benefício definido (BD) têm se tornado uma dor de cabeça para as entidades fechadas de previdência complementar há algum tempo. E cada entidade e plano têm a sua própria razão para chegar à mesma conclusão: as mudanças das premissas utilizadas neste tipo de plano são complexas, difíceis de serem explicadas e, mesmo com testes aplicados às hipóteses que interferem no passivo, variam a cada ano.  

Bom, nada disso é mentira. Sabemos que tábuas de mortalidade são testadas, no mínimo, a cada três anos e não importa se, em seu teste de hipóteses biométricas  que o atuário aplica, em algum momento haverá a mudança da tábua de mortalidade e o fluxo do passivo será alterado. No entanto, quem lida com estes dados sabe que não há hipótese que cause mais ansiedade do que a taxa de desconto atuarial. 

Segundo exigências da PREVIC, as hipóteses de taxa de juros devem ser realizadas anualmente, de forma a comprovar que a taxa de desconto a ser utilizada no cálculo do fluxo do passivo esteja em linha com os retornos esperados pela carteira de investimentos existente. É verdade que, se temos uma carteira, quase que completamente, marcada na curva, os estudos de aderência de taxas de juros não deveriam dar resultados tão diferentes. Mas o que acontece em muitas das entidades de previdência é que os papeis de NTN-B comprados há anos, estão começando a vencer ou têm uma duration curta, em comparação com seu fluxo do passivo. 

Nos dois casos, o estudo fica comprometido, sendo necessário rever a taxa de juros para a avaliação atuarial. Em termos de cenário econômico, 1% a.a. não parece tão assustador, mas aqueles que vivem analisando e conhecem seu fluxo do passivo sabem que qualquer mudança na taxa de juros pode fazer uma diferença importante em seu passivo. 

Para ilustrar melhor este contexto e os respectivos impactos, podemos fazer uma simulação considerando um plano de aposentadoria de modalidade BD, formada exclusivamente por aposentados , ou seja, pessoas já no momento de recebimento de benefícios. Nesta situação, o plano não tem oxigenação de pessoas mais jovens ou entrada de dinheiro. Consideramos também que todos os benefícios são de renda mensal vitalícia e a base de participantes é de 4.264 pessoas. Deste total, 3.427 são aposentados com idade média de 72 anos, recebendo aposentadoria média de R$ 3.521,00 mensais (seja normal ou de invalidez) e 837 são pensionistas com idade média de 73 anos, com benefício de R$ 3.862,10 mensais.  Toda a população que compõe o plano é dividida em 50% homens e 50% mulheres em pensão. 

Neste cenário, uma redução de 0,5% p.p. de sua taxa de juros aumenta o passivo em torno de 4%. Ou seja, para uma taxa de juros de 3,5%, o passivo é de R$ 2.315.258.125,15, enquanto que, para a taxa de 3%, o passivo passa a ser R$ 2.430.081.141,93. Observe algumas simulações:

Taxa de juros anual Reserva
3,00%R$ 2.430.081.141,93 
3,50%R$ 2.315.258.125,15 
4,00%R$ 2.209.556.624,85 
4,50%R$ 2.112.034.889,55 
5,00%R$ 2.021.867.706,44 
5,50%R$ 1.938.329.771,63 
6,00%R$ 1.860.781.738,05 

Nas simulações apresentadas, podemos ver o impacto dos resultados de uma massa total. Quando observamos as reservas individuais, é possível perceber que quanto mais jovem o participante ou dependente com direito a renda mensal vitalícia, maior o impacto em sua reserva. Como na base analisada há mais pensionistas jovens do que aposentados, os pensionistas têm um impacto maior no estudo. Isso acontece pois, quanto mais jovem a pessoa, mais longo o período em que vai receber benefício e consequentemente maior o seu fluxo do passivo e, portanto, maior impacto em sua reserva. Veja as variações médias por faixa etária e mudança de taxa de juros: 

Faixa IdadeDe 3,0% a.a. para 3,5% a.a.De 3,5% a.a. para 4,0% a.a.De 4,0% a.a. para 4,5% a.a.De 4,5% a.a. para 5,0% a.a.De 5,0% a.a. para 5,5% a.a.De 5,5% a.a. para 6,0% a.a.
207,07%6,77%6,49%6,21%5,96%5,71%
307,23%6,86%6,52%6,20%5,90%5,62%
406,69%6,38%6,09%5,82%5,56%5,32%
506,68%6,41%6,15%5,90%5,66%5,44%
605,53%5,34%5,15%4,98%4,81%4,65%
704,35%4,22%4,10%3,98%3,87%3,76%
803,10%3,03%2,96%2,89%2,82%2,75%
902,46%2,41%2,35%2,30%2,25%2,20%
1002,31%2,26%2,21%2,16%2,12%2,07%

Considerando que, a cada ano, essa mesma população envelhece, podemos entender que o passivo deveria diminuir. No entanto, essa redução não consola aqueles que têm fluxos de passivo no limite de um déficit. A diminuição do passivo pelo envelhecimento de sua população não se equivale a um aumento causado pela diminuição da taxa de juros. 

Obviamente estes resultados assumem a necessidade de diminuir a taxa de juros, mas há outras opções, como, por exemplo, diversificar os ativos da carteira para melhorar o retorno esperado. O lado negativo desta opção é um possível aumento no risco que essa diversificação pode causar em uma carteira de plano BD, em que, muitas vezes, os participantes já estão aposentados e o risco de déficit cairá sob a patrocinadora e estes aposentados. O que reforça a necessidade da intensa sinergia entre a área atuarial e a área de investimentos, para que a solução conjunta atenda da melhor forma aos participantes e à patrocinadora.

Lembramos que no caso do passivo atuarial, quanto maior a taxa, menor é o passivo – por se tratar de uma taxa de desconto. E o inverso também é real, quanto menor a taxa de desconto, maior o passivo. Desta maneira, cenários de aumento nas taxas de juros implicam em passivos menores, e cenários com taxas de juros baixos, causam aumento no passivo atuarial. Volatilidade essa, que pode ser suavizada, via estudos de ALM e marcação na curva. 

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